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O fenômeno "pejotização"

09/11/2016 - 09h07

O presente texto tem por objetivo pincelar os pontos da terceirização junto às empresas prestadoras de serviços de saúde e trazer possíveis soluções ao não enquadramento da "Pejotização".

Para iniciar, devemos primeiro buscar a definição de "Pejotização", para poder discorrer sobre o tema. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho, a "Pejotização" está definida como:

[...]fenômeno em que, na realidade, existe a contratação de serviços pessoais, exercidos por pessoa natural, mediante subordinação, de forma não eventual e onerosa, realizada por meio de pessoa jurídica constituída especialmente para esse fim, na tentativa de mascarar a efetiva relação de emprego, com o intuito de burlar os direitos trabalhistas.(TST - RR: 6141220115090012, Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 06/05/2015, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 15/05/2015). (Grifei)

É sabido que muitas empresas prestadoras de serviço de saúde realizam a contratação de seus funcionários médicos e outros profissionais da área da saúde através da pessoa jurídica criada especificamente para este fim, para diminuir suas despesas com encargos trabalhistas e previdenciárias e aumentar o lucro da empresa, seja um consultório médico, um hospital, consultório odontológico e outras empresas que prestam serviços à saúde.

No entanto, este tipo de procedimento pode acarretar em prejuízos financeiros a empresa, que em alguns casos, maiores caso realizassem o pagamento dos encargos trabalhistas.

Os procedimentos tomados pelas empresas que contratam seus funcionários da área de saúde, através da Pessoa Jurídica, reconhecida como fenômeno da Terceirização.

Em termos gerais, a Terceirização é processo pelo qual a empresa contrata um prestador de serviço para desenvolver determinada atividade, consequentemente, não criando o vínculo empregatício. Assim, a relação de emprego se faz entre o empregado/funcionário e a tomadora de serviços/empresa terceirizada.

O entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante é que poderá ser terceirizado o serviço de atividade-meio, sendo aquela que não define a atividade principal da empresa, ou seja, é um serviço não essencial.

Neste sentido, foi firmado entendimento pelo TST, através da Súmula 331, que dispõe:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

[...]

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

[...](Grifei)

Conforme preconizado pelo Tribunal Superior do Trabalho, nos incisos I e III, do dispositivo mencionado, a terceirização somente será lícita quando houver a contratação de serviço temporário ou, serviço ligado a atividade-meio, não formando vínculo de emprego o serviço de vigilância e limpeza, e excepcionalmente nos especializados ligados a atividade meio, desde que não haja pessoalidade e subordinação.

Desta forma, segundo a Consolidação das Leis do Trabalho, nos arts. 2º e 3º, considera relação de trabalho a atividade (a) onerosa, (b) subordinada, (c) não eventual e, com (d) pessoalidade.

A atividade (a) onerosa, é o trabalho realizado pelo profissional de saúde em troca de remuneração, já a atividade (b) subordinada, é o trabalhador contratado sujeito ao comando de um terceiro, contratado pela empresa, sendo este que previamente dita as regras, obrigações e deveres dos funcionários, quanto a atividade (c) não eventual, é a habitualidade, atividade contínua e permanente, a (d) pessoalidade, se caracteriza pelo prestador de serviço que não pode ser substituído por outro profissional ao longo da concretização dos serviços prestados.

Deste modo, embora ocorra à contratação entre as partes por meio de Pessoa Jurídica, é levando em conta os fatos concretos, não sendo ato decisivo a pactuação formalizada por escrito.

Neste sentido, através do Relator Desembargador André R. P. V Damasceno, da 2ª Turma, o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região julgou o Recurso Ordinário nº 00529-2002-017-10-00-0, conforme segue:

TRABALHO AUTÔNOMO X VÍNCULO EMPREGATÍCIO.

1) A Reclamada, ao admitir a prestação de serviços, atraiu para si o encargo de demonstrar que aquela teria se dado de forma autônoma, a teor do dispostos nos artigos 818 da CLT e 333 do CPC, ônus do qual não se desincumbiu;

2) Não há como afastar-se a configuração do vínculo empregatício na hipótese dos autos, uma vez que presentes estão os requisitos do art. 3º da CLT, quais sejam, pessoalidade, onerosidade, habitualidade e subordinação, além da ocorrência de fato impeditivo à terceirização defendida pela Empregadora: ser vedada a prestação de serviços do Reclamante - Médico - diretamente relacionada à atividade-fim da Empregadora: assistência médica. Nos termos do artigo 67, § 1º do Regimento Interno, é do seguinte teor o relatório, admissibilidade e preliminar de nulidade da lavra do Exmº Juiz André R.P.V. Damasceno. (Grifei)

Em outra decisão, o TRT4 decidiu:

[...]

O desempenho das funções de Médico insere-se no conceito de atividade-fim da primeira reclamada, de modo que ilícita a terceirização praticada pelas demandadas, impondo-se o reconhecimento de vínculo empregatício diretamente com a tomadora dos serviços. Inteligência da Súmula 331, I, do TST. (TRT-4 - RO: 00005697020115040004 RS 0000569-70.2011.5.04.0004, Relator: HERBERT PAULO BECK, Data de Julgamento: 12/06/2014,4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, ). (Grifei)

Assim, já sedimentado, recentemente julgou o Tribunal Superior do Trabalho:

RECURSO DE REVISTA. 1. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. Caso em que o Tribunal Regional, com base no conjunto probatório, delineou a premissa de que a Reclamante, médica, foi contratada por empresa interposta para desenvolver atividades no centro de diagnóstico de imagens da Reclamada , realizando ecografias. Assentou que a Reclamada, tomadora dos serviços, notoriamente atua na área de assistência médica e hospitalar. O Tribunal Regional, desse modo, delimitou expressamente o quadro fático de que houve fraude à contratação, restando comprovado que os serviços prestados pela Autora correspondem à atividade final da Reclamada. Evidenciada, também, a subordinação, pessoalidade e onerosidade. Desse modo, ao concluir pela configuração do vínculo empregatício, a Corte Regional decidiu em sintonia com o item I da Súmula 331 do TST, segundo o qual: "a contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974)". Recurso de revista não conhecido. (TST - RR: 1414002220085040022, Relator: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 28/10/2015, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 06/11/2015).(Grifei)

No entanto, como contratar a pessoa jurídica, para realizar uma atividade-fim, sem a caracterização da relação de trabalho, conforme definidos nos arts. 2º e 3º, da CLT e sem comprometer o real proprietário da empresa?

Embora seja unanime o entendimento jurisprudencial e doutrinário não admitindo a terceirização da atividade-fim, há também o entendimento jurisprudencial, que não ocorrendo à subordinação entre aquele que realiza o serviço e o tomador de serviços, não ocorrerá à relação de trabalho.

Este entendimento partiu da 2ª Turma, do Tribunal Superior do Trabalho, no Processo nº TST-RR-59200-80.2009.5.22.0002, que segundo o Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, não pode se caracterizar relação de emprego, quando o prestador de serviço tem apenas sua extensão de consultório, visto que os pacientes buscam o serviço médico profissional e, não aquele que o contratou/instituição.

Outro ponto há entendimento jurisprudencial, embasa sobre o corpo clínico, que segundo o Conselho Federal de Medicina, é o conjunto de médicos de uma instituição incumbidos de prestar assistência a seus pacientes que o procuram, gozando de autonomia profissional, técnica, científica, política e cultural.

Desta forma, a relação entre os médicos e estabelecimentos de saúde, geram apenas a relação jurídica contratual, onde que as regras estabelecidas, deveres e cuidados, estão dispostos em contrato, não havendo qualquer intervenção da instituição sobre o contratado em quem o auxilia no estabelecimento.

Este entendimento, encontra-se respaldo jurídico junto ao Tribunal de Santa Catarina, vejamos:

MÉDICO. VÍNCULO DE EMPREGO NÃO RECONHECIDO. Comprovado que o trabalho executado pelo autor era prestado com autonomia, não se reconhece a relação de emprego(TRT/SC, RO 00459200304012008, Rel. Juiz Edson Mendes De Oliveira Publicado no DJ/SC em 06072005, página: 251).(Grifei)

Contrato de trabalho. Médico integrante de corpo clínico autônomo de hospital, regido unicamente por normas técnicas e operacionais auto instituídas. Ausência de subordinação jurídica e de pessoalidade. Não é empregado de hospital o médico que nele atua por ter sido admitido no corpo clínico, sociedade civil de fato que, sob os auspícios do Conselho Regional de Medicina, opera em situação de completa autonomia técnica, utilizando-se apenas das instalações, recursos, equipamentos e serviços de apoio do nosocômio. (TRT/SC, ROV 4991/2000, Rel. Juiz Luiz Fernando Vaz Cabeda Publicado no DJ/SC em 25042001, página: 258).(Grifei)

Vejam, que tanto aquele prestador de serviço que tem uma extensão de seu consultório ou outro estabelecimento, como do corpo clínico prestador de serviço, tem como regra a não subordinação e pessoalidade, devendo integrar ainda a eventualidade existente sobre a relação jurídica com o tomador de serviços. Havendo apenas o cumprimento integral do instrumento particular.

Porém, deve-se entender qual a melhor forma de realizar a prestação de serviços junto ao tomador de serviços, qual o melhor instrumento particular, levando-se em conta que não poderá ocorrer à subordinação, pessoalidade e, a não eventualidade, em outras palavras, a habitualidade.

Desta forma, em estudo aos instrumentos jurídicos, embora haja uma possibilidade de realizar um instrumento particular de Contrato de Prestação de Serviços, este instrumento já se encontra viciado, tanto na doutrina, como no entendimento dos Tribunais. A forma jurídica e viável a realização de instrumento particular enquadra-se na Lei nº 8.245/91, que dispões sobre a locação de imóveis urbanos e os procedimentos por elas pertinentes.

Assim, deverá ser firmado um Contrato de Locação Comercial ou, Sublocação Comercial, na forma simples e pura, locando ou sublocando sala ou consultório médico, deixando a empresa de integrar como Tomador de Serviço e passando a aderir nova forma jurídica, como Locador ou Sublocador, quando ao prestador de serviço, passará a integrar a forma jurídica de Locatário ou Sublocatário, atendidos e regidos pela Lei nº 8.245/91 (Lei das Locações).

Deste modo, o instrumento particular passará a ser denominado como "Instrumento Particular de Locação Comercial/Sublocação Comercial".

De outro modo, ficará consubstanciada ao instrumento particular a definição:(a) objeto contratual; (b) prazo que se dará a locação ou sublocação; (c) forma do aluguel, que deverá conter o bloco de horário de atendimento dentro do objeto de locação/sublocação; (c) valor por bloco ou hora; a garantia do cumprimento contratual; (d) reajustes e encargos locatícios; (d) benfeitorias; (e) forma de rescisão contratual; (f) a destinação e legalização, com o fins de atender unicamente as atividades de saúde; (g) tratamento legal e moral sobre os funcionários e contratados entre as partes, devendo o Locatário/Sublocatário cumprir integralmente com todas as regras trabalhistas, tributárias e previdenciárias no seu exercício; (h) as obrigações das partes do instrumento particular. Esta é a parte mais importante do contrato, onde verá conter todas as obrigações atinentes as partes, ou seja, é o ponto que o Locador/Sublocador regula a forma que o Locatário/Sublocatário deverá se portar diante a empresa, suas obrigações e deveres; também outro ponto importante no instrumento particular figura a (i) responsabilidade entre as partes, onde está exposto toda a responsabilidade que estas tem entre si; por fim, deverá conter o (j) registro do contrato e (l) foro para dirimir qualquer dúvida suscitada da execução do contrato.

Observem, que no presente instrumento não irá ocorrer à subordinação, pelo fato de já constar no termo as obrigações e responsabilidade, a pessoalidade, pelo fato do locatário/sublocatário poderá a qualquer hora se fazer substituir por outro profissional e, a não-eventualidade, que é a atividade habitual, contínua e permanente, pelo fato que estará exposto na forma contratual que a locação de espaço comercial, estará adstrita ao bloco de horários ou horários.

Outro ponto a se observar, é que não será mais a empresa (Locadora/Sublocadora) que realizará o pagamento ao Prestador de Serviço (Locatário/Sublocatário) e, sim o Locatário/Sublocatário.

Ademais, todos os serviços e despesas que este gerar na empresa que sede o espaço mediante uma remuneração, ficará obrigado ao ressarcimento.

Assim sendo, firmado o Contrato de Locação/Sublocação Comercial, passa a não existir mais o fenômeno "Pejotização", existindo sim uma forma jurídica legal de atender suas necessidades.

Para tanto, deve ser cumprido tanto pelo Locador/Sublocador, como Locatário/Sublocatário, os termos constantes ao termo jurídico, para que não hajam premissas à "Pejotização" e, assim, posteriormente uma discussão judicial e eventual condenação.